domingo, 6 de outubro de 2013

Monte Azul, no Norte de MG, depende de carros-pipa para sobreviver


Barragem do rio Tremedal, que abasteceu Montes Azul, secou após 21 anos

(G1) Construída em 1986, a barragem do Rio Tremedal abasteceu o município de Monte Azul por mais de 21 anos. Porém, em fevereiro de 2013, a água desapareceu. A barragem abastecia a cidade e a zona rural, que agora dependem totalmente de caminhões-pipa. Dos 23 mil habitantes, cerca de 26% dos moradores já abandonaram a cidade em busca de melhores condições de vida.
Nesta 4ª reportagem da série “Vidas Áridas na Estrada”, a expedição esteve no município do extremo Norte de Minas Gerais, juntamente com os parceiros técnicos, para avaliar e diagnosticar os efeitos provocados pela seca que atinge o sertão norte-mineiro. Cerca de 2 mil quilômetros já percorridos pela caravana.
O superintendente regional da Copasa Daniel Antunes esteve no local a convite da expedição e afirmou que a companhia pode assumir o controle da barragem do Rio Tremedal, como resposta a uma das demandas do Vidas Áridas.
“A barragem foi construída pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs), que pode transferir o controle para Copasa. Se assumirmos, pretendemos fazer um plano de manejo, evitando novos assoreamentos, construindo barragens de pedras, que impeçam a entrada de areia, enfim, fazendo toda segurança para que a barragem não sofra uma nova deterioração com o passar dos anos, e que água da chuva seja devidamente captada e fique no barramento”, diz.
Para o superintendente, a iniciativa do projeto Vidas Áridas contribui para que poder público interfira e faça mudanças representativas para a população. “O projeto vai onde as coisas acontecem, mostrando à população as mazelas e buscando iniciativas positivas que precisam ser tomadas. O Vidas Áridas hoje é um guardião da sociedade, existe para proteger os interesses da população”, completa.

Crise econômica
Os prejuízos causados pela seca em Monte Azul vão além da paisagem ressecada e do evidente processo de desertificação. O município, que depende 100% do abastecimento de carros-pipa, está vivendo um processo de êxodo.
Segundo o vice-prefeito Antônio Idalino Teixeira, cerca de seis mil habitantes já deixaram a cidade desde o início de 2013; alguns foram trabalhar na colheita do café no Sul de Minas, outros no corte de cana de açúcar no interior de São Paulo. Ainda segundo Antônio Idalino, os jovens também estão deixando suas famílias, em busca de melhores condições de vida em outros estados. “O comércio local já demitiu 20% dos funcionários, e os que ficaram dependem dos programas sociais e do seguro safra”, diz.
Na zona rural da Monte Azul, a situação diante de uma seca tão brutal, ameaça ainda mais o sertanejo, que se vê impotente diante das suas próprias limitações. Na comunidade de Limoeiro, o lavrador Delci Silveira Lins, de 61 anos, vive com a esposa e os quatro filhos e diz que não tem para onde ir. “Nasci e fui criado aqui. Minha mãe foi criada aqui. Eu me imagino saindo para o mundo, mas não resolve, sou analfabeto, tenho que ficar aqui”, conta.
Emocionado, o lavrador diz que a criação está morrendo, e que está tirando da boca dos filhos para poder alimentar as poucas cabeças de gado que restaram. Há menos de um ano, Delci possuía 20 animais no seu pequeno rebanho, com a seca, 12 morreram.
“Compro um saco de 60 quilos de milho a R$ 44, e dou um pouquinho pra cada animal, mas não é suficiente. Hoje mesmo perdi mais uma vaca, que foi no alto do morro para caçar folha e acabou morrendo. Eu e minha família ficamos até dez horas tentando salvar, mas não conseguimos”, diz.
Os animais mortos estão espalhados pela pequena propriedade de Delci, e os vivos aguardam junto com o lavrador  por um milagre. “Nasceram dois bezerros há três dias, mas a mãe não dá leite suficiente, porque também está fraca. Se não chover em 10 dias, ela também vai morrer”, lamenta.
O extensionista da Emater Antônio Carlos Araújo comenta a tragédia do pequeno produtor e acredita que sair da localidade não é a melhor opção para o lavrador. “A pessoa tem toda sua vida construída na região, para ele é muito difícil deixar suas raízes e partir para outras partes do país, porque ele também vai encontrar dificuldades lá fora”, diz.
Segundo Antônio Carlos não chove em Monte Azul há aproximadamente 10 meses, o que representa uma perda na lavoura de cerca de 90%, além das condições de pastagem ser zero. “Não existe nenhuma forma de oferecer pasto para alimentar o rebanho. Quem pode comprar um milho, ou arrumar uma ração de concentrado, vai salvaguardando o rebanho, mas se a chuva não chegar, não tem jeito”, completa.
Para o coordenador da Defesa Civil da Amams Sergio Nassau a situação de emergência do extremo Norte do estado requer um novo modo de convivência com as seca. “Temos levado ao governo uma reivindicação para construção de barramentos na região. Acreditamos que com recursos e estudos técnicos, voltados para perenização de rios, vamos recuperar os rios do Norte de Minas e Jequitinhonha”.
A escassez de recursos hídricos e extrema pobreza nos municípios do Norte de Minas, por onde a expedição Vidas Áridas tem percorrido, é vivenciada pelos moradores de todo município. A falta de água para consumo humano e dos animais tem sido um desafio nas cidades e na zona rural.
A situação da região da Serra Geral é o retrato do que se passa em todo Norte de Minas. De acordo com Geraldo Humberto, um dos responsáveis pelo projeto, essa iniciativa popular tem unicamente o objetivo de chamar a atenção do poder público para a crise que se instalou no semi-árido mineiro. “Precisamos que os governantes se sensibilizem com a necessidade de intervenção e mudanças no sertão. Nós pretendemos fazer desse movimento uma ação popular, deixando a política de lado e agindo para dar uma condição digna de vida ao sertanejo”, diz.

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