sábado, 2 de abril de 2016

Informar blitz em redes sociais pode ser considerado crime

Delegado especializado em crimes cibernéticos pede à Justiça autorização para identificar mineiros que avisam sobre operações da Lei Seca. ele quer indiciá-los por atentado à segurança

Quase 80 mil seguidores de uma conta no microblog Twitter que avisa sobre blitzes da Lei Seca em Belo Horizonte estão na mira da Polícia Civil. A delegacia especializada em crimes cibernéticos apura a participação de tuiteiros na postagem de 16 mil mensagens no site Blitz BH e pediu à Justiça quebra do sigilo de IP dos computadores para chegar aos autores das mensagens. IP é a sigla para internet protocol, número de cada máquina que serve para indicar a localização do equipamento. Na avaliação da polícia, quem avisa sobre blitzes pode ser enquadrado por atentado contra a segurança ou ao funcionamento de serviços de utilidade pública, crime previsto no artigo 265 do Código Penal.

Os responsáveis pela criação da conta – dois jovens na faixa etária de 20 anos – foram identificados e ouvidos na delegacia e também podem ser indiciados. O delegado Pedro Paulo Marques, responsável pelo caso, quer se reunir com representantes de empresas que hospedam essas informações na internet e com membros do Ministério Público e do Poder Judiciário para discutir o assunto. A punição prevista para o crime é de reclusão de um a cinco anos. “A prática é considerada crime e tem uma pena alta, semelhante à punição atribuída por crime de estelionato”, afirma Marques, que pretende entregar um inquérito completo ao Ministério Público. Além de punir os autores dos perfis na internet, o policial quer a retirada das contas do ar.

De acordo com o delegado Pedro Paulo, outras contas no Twitter e também aplicativos de smartphones podem ser atingidos pela investigação. “O inquérito não tem uma conta específica. Começamos com o Blitz BH que é um dos mais conhecidos, mas existem muitos outros. A internet está repleta deles”, diz. As ferramentas são alimentadas por informações de trânsito de forma geral, como pontos de congestionamento, acidentes e furto de veículos. Mas trazem também alertas sobre a presença de polícia em ruas e avenidas e a localização dos pontos de operações da Lei Seca. Serviços como o Trapster e o Lei Seca Mobile também têm milhares de seguidores. Além disso, segundo o delegado, existem softwares e aplicativos de smartphones, como o Waze, que não têm representantes no Brasil. “Desse modo, ficam livres do rigor da legislação brasileira”, reclama. 

Ações 

O uso das redes sociais e de aplicativos para alertar sobre blitzes já foi alvo de ações em outros estados, mas a tentativa de punir internautas divide especialistas e autoridades. No ano passado, a Advocacia Geral da União (AGU) ajuizou ação em Goiás contra a divulgação de informações sobre localização de radares e blitzes. O Ministério Público Federal em Goiás (MPF-GO), no entanto, manifestou-se contrário à ação. Por causa de ação semelhante em Vitória (ES), a Justiça chegou a proibir que essas informações fossem divulgadas em redes sociais.

Na avaliação do comandante do Batalhão de Trânsito de Belo Horizonte, tenente-coronel Roberto Lemos, as publicações atrapalham o trabalho policial porque acabam com o fator surpresa característico da blitz. “Essas mensagens são um desserviço. Podem não só atrapalhar no cumprimento da Lei Seca como também evitar que outros tipo de crimes sejam coibidos”, afirma, referindo-se a furtos de veículos, sequestros relâmpago, transporte de armas e de drogas, autuação de motoristas inabilitados, entre outros. “É uma ação que prejudica a segurança das pessoas”, completa. Para o advogado criminalista Warley Belo, “é absurdo adaptar o artigo 265 (do Código Penal) para uma realidade sobre a qual ele não diz respeito”. Ele defende que seria necessária uma legislação específica para punir a prática. “É uma medida autoritária”, avalia.

O delegado Pedro Paulo Marques reconhece que é necessária uma atuação conjunta com outros órgãos para apuração dos casos. “Não adianta prender duas pessoas que foram identificadas. O assunto não é só de um caso de polícia, é preciso inclusive repensar a legislação”. Segundo ele, a Polícia Civil pretende implantar na capital um laboratório especializado de combate a fraudes eletrônicas e crimes de alta tecnologia. A unidade atuará no apoio às delegacias de todo o estado. “O caso continua sendo investigado pelo delegado da cidade onde o crime ocorreu, mas ele terá suporte dos investigadores e do delegado do laboratório”, disse.

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