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CFP manifesta repúdio à nota técnica “Nova Saúde Mental” publicada pelo Ministério da Saúde
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O Conselho Federal de Psicologia (CFP) vem a público manifestar repúdio à Nota Técnica Nº 11/2019 intitulada “Nova Saúde Mental”, publicada pela Coordenação-Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas, do Ministério da Saúde, na última segunda-feira (4). O teor do documento aponta um grande retrocesso nas conquistas estabelecidas com a Reforma Psiquiátrica (Lei nº 10.216 de 2001), marco na luta antimanicomial ao estabelecer a importância do respeito à dignidade humana das pessoas com transtornos mentais no Brasil.
A nota apresenta, entre outras questões que desconstroem a política de saúde mental, a indicação de ampliação de leitos em hospitais psiquiátricos e comunidades terapêuticas, dentro da Rede de Atenção Psicossocial (RAPs), incentivando assim o retorno à lógica manicomial. O Ministério da Saúde também passa a financiar a compra de aparelhos de eletroconvulsoterapia.
A representante do CFP no Conselho Nacional de Saúde (CNS), conselheira Marisa Helena Alves, explica que a medida rompe com a política de desisntitucionalização e incentiva a hospitalização e o tratamento desumanizado. Ela ressalta a gravidade da desconstrução da Rede de Atenção Psicossocial (RAPs), com a inclusão dos hospitais psiquiátricos entre os mecanismos.
“Consideramos um retrocesso a inclusão dos hospitais psiquiátricos nas RAPs. Com a Reforma Psiquiátrica, o paciente psiquiátrico passava a ter essa atenção fora dos muros do manicômio e consequentemente em liberdade, podendo ter todo o seu direito de cidadão de ir e vir preservado”, explica Marisa.
“Este modelo coloca o hospital no centro do cuidado em saúde mental, priva o sujeito da liberdade, dentro de um sistema que não favorece a recuperação, mas simplesmente o isolamento”, conclui.
São diretrizes da Rede de Atenção Psicossocial: o respeito aos direitos humanos, garantindo a autonomia, a liberdade e o exercício da cidadania; Promoção da equidade, reconhecendo os determinantes sociais da saúde; Garantia do acesso e da qualidade dos serviços, ofertando cuidado integral e assistência multiprofissional, sob a lógica interdisciplinar; Ênfase em serviços de base territorial e comunitária, diversificando as estratégias de cuidado, com participação e controle social dos usuários e de seus familiares.
*Carta do Encontro de Bauru*
Outro marco na luta antimanicomial é o Encontro de Bauru, que completou 30 anos em 2017.
Em dezembro de 1987, trabalhadores da saúde mental reunidos na cidade de Bauru (SP) redigiram o manifesto que marca o início da luta antimanicomial no Brasil e representa um marco no combate ao estigma e à exclusão de pessoas em sofrimento psíquico grave. Com o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, o congresso discutiu as formas de cuidado com os que apresentam sofrimento mental grave e representou um marco histórico do Movimento da Luta Antimanicomial, inaugurando nova trajetória da Reforma Psiquiátrica brasileira.
Para marcar os 30 anos do Encontro, Bauru sediou outro congresso em dezembro de 2017, onde aprovou uma nova carta, na qual reafirma que uma sociedade sem manicômios é uma sociedade democrática, uma sociedade que reconhece a legitimidade incondicional do outro como o fundamento da liberdade para todos e cada um.
Diante da atual conjuntura de avanço do conservadorismo e de redução de recursos para as políticas públicas sociais, com violento ataque ao Sistema Único de Saúde (SUS), é preciso reforçar a desconstrução do modelo asilar e combater a cada dia o manicômio em suas várias formas, do hospital psiquiátrico à comunidade terapêutica, incluindo o manicômio judiciário.
Justiça memória e reparação. Marcus Vinicius presente
“Dos desafios que Marcus Vinicius apontou para a Psicologia, boa parte foi respondida.” Assim, o presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Rogério Giannini, abriu a homenagem a Marcus Vinicius, no dia 16, durante o Fórum Social Mundial (FSM 2018), em Salvador. Uma das provocações deixadas por Marcus foi o da classe compreender para quê e a quem serve a Psicologia.
O vice-reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Paulo Cesar Miguez de Oliveira, complementou que a luta pelos direitos humanos no Brasil foi fortalecida pela figura de Marcus Vinicius. “Com suas contribuições e intervenções, ele era uma figura de proa na Psicologia”.
A psicóloga e professora da UFBA Ilka Bichara também lembrou que as histórias trágicas de Marcus e Marielle Franco, concretizadas pela cultura “da bala”, devem servir para se estabelecer um outro marco civilizatório. Para ela, o Brasil é um país que tem culturas muito trágicas: do estupro, do feminicídio, seja na favela ou nas cidades, grandes ou do interior. “As estatísticas são de vozes caladas todos os dias.”
A filha de Marcus, Natália Oliveira, representou a família, e emocionou todos ao comparar sua experiência de perda como filha em relação às filhas de Marielle. “Que nos façam acreditar na justiça, por que sabemos que sem isso é impossível seguir.”
“Lugar de louco é ocupando todos os espaços”
A representante da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (Renila) Marta Elisabete de Souza contou que Marcus se tornou uma grande liderança e articulador de propostas e intervenções que viabilizaram o movimento. Ela citou as criações da Comissão Nacional da Reforma Psiquiátrica no Conselho Nacional de Saúde e da Lei Paulo Delgado. Falou, ainda, de sua participação na criação da Caravana da Cidadania, na organização dos usuários, na Marcha dos Usuários e na redação da Carta de Bauru.
Além de defensor da luta antimanicomial, Marcus Vinícius era crítico e corria riscos. Para ele, era possível, numa democracia, fazer a loucura caber entre nós e na sociedade. ‘Pra gente lutar, a gente tem que colocar o corpinho’, dizia ele. “Ele acreditava na capacidade dos usuários e psicólogas”, afinal ‘Lugar de louco é ocupando todos os espaços’.
Para Ana Bock, representante do Instituto Silvia Lane, idealizado e criado por Marcus Vinícius, é cada vez mais difícil falar sobre ele. “Todos sabemos como é difícil falar de uma pessoa plural como ele era”. Marcus, segundo Ana Bock, tinha grande capacidade de fazer análises de conjuntura. “Ele conseguia captar as contribuições que as pessoas tinham a dar. Era capaz de melhorar sínteses e pensamentos.”
Sem democracia, não existe política pública de saúde mental
Sem democracia, não existe política pública de saúde mental. Esse foi o consenso entre todos os debatedores do seminário “Alterações na política nacional de saúde mental e os impactos na luta antimanicomial”, promovido pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) e pela Comissão Intersetorial de Saúde Mental do Conselho Nacional de Saúde (CNS/CISM). As discussões ocorreram, dia16 de março, na Tenda Marcus Vinícius, montada no Fórum Social Mundial (FSM 2018), em Salvador (BA).
A vice-presidente do CFP, Ana Sandra Fernandes, fez a mediação do debate, que lembrou os 30 anos da luta antimanicomial e os retrocessos na área com as novas medidas do atual governo. A resolução da Comissão Intergestores Tripartite (CIT) de dezembro de 2017 – que estabeleceu novas diretrizes para a Rede de Atenção Psicossocial (Raps) – foi duramente criticada pelos participantes, por desfigurar a política de saúde mental e afrontar as diretrizes da política de desinstitucionalização psiquiátrica, prevista na Lei 10.216/2001.
“Direta ou indiretamente, a nova política propõe retroagir no tempo. No tempo do desrespeito a todos os direitos, no tempo da violência no trato, do cerceamento da liberdade, do enclausuramento, no tempo da invalidação como modo de vida, do silenciamento imposto pelo enfadonho monólogo da razão, o tempo do abandono e da negligência, da infantilização e da tutela”, criticou a psiquiatra, psicóloga e membro da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (Renila), Miriam Abou-Yd.
Retrocessos
Na mesma linha, o membro da Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH), Leonardo Pinho, ressaltou que as medidas anunciadas pelo atual governo violam a Constituição Federal e que os retrocessos não estão ocorrendo apenas na saúde. “São passos para trás em direitos já conquistados pelo povo.”
Pinho destacou como medida mais extrema dos retrocessos a aprovação da Emenda Constitucional no 95, que congela investimentos públicos nas áreas sociais por 20 anos. “Ao rasgar a Constituição de 88, criaram regressividade na democracia brasileira e diminuíram sua intensidade. E sem democracia não há política de saúde pública universal, não há um processo de reforma psiquiátrica.”
Entre as políticas de saúde mental atingidas pelos retrocessos está a política de redução de danos relacionada ao uso de drogas. É o que afirmou o representante da Associação Brasileira de Redução de Danos (Aborda), Domiciano Siqueira. Na sua avaliação, a política de redução de danos só é possível dentro do ideal dos direitos humanos.
A presidente da Federação Nacional dos Psicólogos (Fenapsi), Shirlene Queiroz, enfatizou os avanços na política de saúde mental na última década, interrompidos com as últimas decisões governamentais. “A 4ª Conferência Intersetorial de Saúde Mental sinalizava que não bastavam apenas Caps ou residências. Vislumbramos aquilo que a gente dizia há 30 anos, que para erradicar internação em hospital psiquiátrico era preciso ter serviços e oportunidades de cuidado. Começamos, então, a trabalhar com a rede de atenção psicossocial, mas, a partir de 2016, a rede de atenção psicossocial começa a ser desmontada.”
Resistência
Os debatedores também falaram de resistência. Domiciano Siqueira lembrou que “é no recrudescimento que a gente acorda” e Leonardo Pinho garantiu: “Vai ter muita resistência. Violam a democracia, mas estamos resistindo, porque 30 anos de luta não podem ser apagados com uma canetada”. Shirlene Queiroz completou, afirmando que para calar um, será preciso calar todos nós, “porque o nosso grito vai ecoar ontem, hoje e sempre”. Por sua vez, Miriam Abou-Yd destacou que, enquanto o autoritarismo é um dos componentes típicos da lógica manicomial, “a delicadeza, a coerência, o respeito e a democracia são exigências essenciais e inevitáveis na construção e sustentação de uma política de saúde mental”.
Sistema prisional
A atuação da Psicologia no sistema carcerário também foi tema de debate na Tenda Marcus Vinícius, durante o seminário “Sistema Prisional: perspectivas no enfrentamento à violação de direitos”.
O conselheiro Pedro Paulo Bicalho, do CFP, destacou que, se na década de 1970, a maioria da categoria atuava na área clínica, agora mais de 60% estão nas políticas públicas. “A pergunta que a gente se faz é: será que a nossa formação hoje também contempla essa interface da Psicologia com as políticas públicas?”.
Alfredo Assunção, doutorando em Psicologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), destacou o impacto das privatizações e da terceirização no aumento dos casos de violação de direitos no sistema prisional e questionou qual seria o motivo de o Brasil insistir na privatização de penitenciárias, mesmo com exemplos de fracasso em todo o mundo.
A conselheira Marcia Badaró, também do CFP, fez um recorte do encarceramento feminino e apresentou sua experiência de 32 anos como psicóloga no sistema prisional, cuja população carcerária feminina cresceu 698%, em 16 anos. Badaró contou que, do total das mulheres presas, 80% são mães ou responsáveis principais ou únicas pelos cuidados de filhas e filhos. Ela mostrou que o encarceramento feminino gera outras graves consequências sociais. “Na minha experiência esse era o maior problema: os filhos que ficaram na rua. Enquanto em uma unidade prisional masculine, os presos ficam mais preocupados com o andamento de seus processos, na unidade feminina, as perguntas são para saber onde e como estão os filhos. Essa angústia é enorme para as mulheres. Além disso, 45% delas têm menos de 25 anos, 57% são pardas e 53% têm menos de oito anos de estudo. Além disso, 43% ainda não tiveram seus casos julgados e estão em prisão provisória”.
Badaró lembrou, ainda, que há legislações no país que permitem substituir a prisão preventiva pela prisão domiciliar em caso de mulher grávida, ou que preveem o regime domiciliar para presas provisórias que sejam gestantes ou que tenham filhos pequenos. Mas reforçou que, na maioria dos casos, essas legislações não são efetivadas.
Violência contra LGBTs, luta antimanicomial, guerra às drogas e olhar negro
A diversidade de bandeiras do Fórum Social Mundial 2018 está refletida nas Tendas Marcus Vinícius e Direitos Humanos, organizadas pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) e parceiros no campus de Ondina da Universidade Federal da Bahia, em Salvador.
No dia 14, na tenda Marcus Vinícius, os participantes do seminário sobre “Direitos Humanos e Psicologia: ações de enfrentamento à violência e à discriminação da população LGBT” falaram sobre as resoluções 01/99 e 01/18, de combate à discriminação e violência contra a população LGBT.
No debate sobre a luta antimanicomial, mostrou-se que a lógica que movimenta as comunidades terapêuticas é a do capital, já que os usuários são geradores de lucro para instituições privadas, às quais mantém pessoas privadas de liberdade sem um devido projeto terapêutico singular.
Na tenda Direitos Humanos não foi diferente e as discussões giraram em torno da relação entre a guerra às drogas, o genocídio da juventude negra e o encarceramento em massa. A discussão sobre o olhar negro no retrocesso da política brasileira atual mostrou como o Estado mínimo, especialmente na área da saúde, interfere diretamente na vida da população negra.
Unificação de pautas
Ematuir Costa, representante da Comissão dos Direitos Humanos do CFP (CDH-CFP), falou sobre as resoluções 01/99 e 01/18, que estabelecem normas de atuação para profissionais da Psicologia em relação à orientação sexual e em relação às pessoas transexuais e travestis. “A gente conseguiu unificar uma pauta e agora precisamos seguir unidos para garantir direitos de grupos vulneráveis.”
A presidenta do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG) Dalcira Ferrão, afirmou que, por meio da conduta profissional em relação ao tema, a categoria precisa entender “que faz parte da agenda dessa luta”.
Outro representante da CDH-CFP, Theófilo Gravinis, traçou um panorama da causa LGBT e falou sobre o combate à discriminação e a violência diária sofridos por homens e mulheres trans. “Por isso, devemos buscar a efetivação das políticas públicas dirigidas a esses grupos.”
A procuradora Débora Duprat, do Ministério Público Federal (MPF), lembrou, ainda, a decisão histórica do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a alteração do registro civil de pessoas trans, independentemente da cirurgia de transgenitalização.
Comunidades terapêuticas
Leo Pinho, integrante do Mecanismo de Combate à Tortura, contextualizou a atuação da instituição em relação ao usuário e à política de combate às drogas no Brasil. “Os usuários são geradores de lucro para os hospitais privados, sendo esse o interesse que movimenta a lógica das comunidades terapêuticas”.
O presidente do CFP, Rogério Giannini, disse que as comunidades terapêuticas são um duplo engano: “Nem são comunidades, tampouco terapêuticas. São uma apropriação de clínicas com caráter religioso.” Ele relatou que o grupo que realizou as inspeções está elaborando um relatório muito complexo sobre o tema.
A procuradora Débora Duprat falou da diversidade e lembrou a Constituição de 88. Comentou, ainda, a Lei 10216, que trata de saúde mental.
Juventude negra e encarceramento em massa
O debate sobre “Guerra às drogas, genocídio da juventude negra e encarceramento em massa” teve mediação do conselheiro Pedro Paulo Bicalho e da coordenadora da Comissão de Direitos Humanos do CFP, Ana Luiza Castro.
Miriam Abou-Yd, da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, falou sobre a busca da sociedade por fórmulas de felicidade, que “investe em estratégias de alienação”. Marlon Weichert, procurador regional da República do Ministério Público Federal, apontou a perseguição sistemática da população negra no Brasil. “A violência é um elemento estrutural no Brasil, historicamente. No país, o outro é sempre visto como objeto e não como sujeito de direito.” Lúcio Costa, psicólogo do Mecanismo Nacional de Combate e Prevenção à Tortura, disse que a guerra às drogas é um projeto racista. Paulo Vanucchi, da TV dos Trabalhadores (TVT) e ex-ministro dos Direitos Humanos, apontou saídas ao monopólio da comunicação e a psicóloga Jesus Moura lembrou que o racismo no Brasil é instituído e está presente em todos os lugares. “Por isso, a população negra nasce vítima de violência, sendo maioria no sistema prisional.”
O olhar negro
A representante do CFP na mesa sobre o olhar negro no retrocesso da política brasileira atual, conselheira Célia Zenaide, fez o recorte da Psicologia sobre o tema e destacou como o racismo estrutural e estruturante prejudica a saúde mental da população negra. “O desmonte da Lei da Reforma Psiquiátrica e outros retrocessos nas políticas de saúde nos atingem diretamente, porque a população negra é a maioria dos usuários nas unidades básicas de saúde.”
Zenaide lembrou as ações do CFP de combate ao racismo, como a Resolução CFP nº 18/02, que estabelece normas de atuação para profissionais da área em relação a preconceito e discriminação racial, e a cartilha de Referências Técnicas para Psicólogas(os) sobre Relações Raciais, que faz um mapeamento sobre o racismo no Brasil e busca contribuir para qualificar a atuação profissional no que diz respeito à diversidade racial e ao sofrimento psíquico advindo do racismo.
Jupiara Castro, membro da Comissão de Políticas de Promoção da Equidade do Conselho Nacional de Saúde (CNS), destacou que o olhar negro sobre uma política pública da sociedade não é uma política apenas para o povo negro, mas para toda a população brasileira, já que os negros são a maioria da população. Também participaram do debate Maria Inês Barbosa, representante da Organização Panamericana de Saúde (Opas), Magali Almeida, professora da UFBA, e a jornalista Valéria Lima, do Ile Aiyê.
Saiba mais sobre o FSM 2018 e acompanhe a cobertura do encontro.
Veja fotos dos debates do dia
Sessão da Câmara homenageia os 30 anos da luta antimanicomial
Representantes da luta antimanicomial, profissionais de saúde mental, usuários e familiares se reuniram, na manhã desta segunda-feira (18/12), na Câmara dos Deputados, em Brasília, para celebrar os 30 anos da luta antimanicomial. O presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Rogério Giannini, a psicóloga Clarissa Guedes e o psicólogo Paulo Maldos, integrantes do CFP, participaram do evento.
Giannini lamentou a votação ocorrida na semana passada, na Comissão Intergestores Tripartite (CIT), que aprovou resolução alterando a política de saúde mental ao estabelecer novas diretrizes para a Rede de Atenção Psicossocial (Raps), que retrocede o modelo de atenção à saúde mental à lógica ambulatorial. “Estamos de volta ao modelo manicomial.” Giannini também mencionou o Encontro de Bauru de 2017 e sua “capacidade de reconstruir a luta antimanicomial”.
Assista abaixo à sessão solene da Câmara dos Deputados em homenagem aos 30 Anos da Luta Antimanicomial.
A mesa da sessão foi composta também pelo perito do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate a Tortura (MNPCT), Lucio Costa, pelo coordenador do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial da Fiocruz, Paulo Amarante, pelo representante do Movimento Pró-Saúde Mental, Thiago Ribeiro, pelo representante da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (Renila), Viviane de Matos Gama, pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, e pelo representante da Inverso, Centro de Convivência e Recriação do Espaço Social, Thiago Petra.
A deputada Érika Kokay (PT/DF), presidente da sessão, afirmou que “a reforma psiquiátrica entrou na vida das pessoas e isso é irreversível”. Kokay disse que pretende apresentar um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) para sustar a portaria da CIT, pois a norma “fere a Constituição Federal com o retorno de uma lógica pela qual já passamos”.
Confira a análise do presidente do CFP, Rogerio Giannini, da conselheira do CFP, Clarissa Guedes e Leo Pinho, membro do Conselho Nacional dos Direitos Humanos – CNDH sobre a sessão solene da Câmara dos Deputados em homenagem aos 30 Anos da Luta Antimanicomial.
A sessão também homenageou Samuel Barros Magalhães, ativista da luta antimanicomial, poeta, artesão e um dos fundadores da Torre de TV de Brasília. Sua irmã, Marta Magalhães, recebeu flores e placa simbólica. Um poema de autoria de Samuel, “Marcha da Liberdade”, foi lido em plenário.
Marcha da Liberdade
Uma parte do poema diz:
“Arrasta-me daqui loucura
Arrasta-me para a extremidade do bem
Que o teu mal é menor do que eu li no jornal
Leve-me aos poucos ou de uma vez
Como a minha mente me assalta-me surta,
Converte-me, mas não me deixe normal.”
A sessão foi encerrada com a apresentação da banda Maluco Voador, do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) do Paranoá (DF).
Saiba mais
Assista a cobertura em vídeo realizada pelo CFP
Análises de Rogério Giannini, Clarissa Guedes e Léo Pinho
Transmissão do evento
Leia o Manifesto de Bauru (1987).
Leia a Carta de Bauru 30 anos (2017).
Sistema Conselhos de Psicologia pela luta antimanicomial
“Nenhum passo atrás, manicômio nunca mais”. Esse foi o grito de ordem das psicólogas e psicólogos, reunidos em ato pela luta antimanicomial, na tarde deste domingo (17), em frente à Autarquia. Manifesto reuniu representantes dos 23 Conselhos Regionais e do Conselho Federal de Psicologia, após aprovação de posicionamento contrário às “Diretrizes para o Fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial” apresentado em 14 de dezembro, na Comissão Intergestores Tripartite (CIT).
O Sistema Conselhos de Psicologia repudia o retorno do financiamento aos hospitais psiquiátricos e dos ambulatórios como parte estruturante da assistência em saúde mental no contexto de fragilização do cuidado territorial da Atenção Primária em Saúde. Citando as Cartas de Bauru de 1987 e de 2017, o posicionamento aprovado neste domingo reforça que os manicômios são espaços de opressão e que não são geradores de saúde que não dão conta das questões sociais implicadas na atual conjuntura.
Confira a íntegra o Posicionamento do Sistema Conselhos contrário ao Plano Nacional de Saúde Mental.
CFP repudia aprovação de mudanças na política de saúde mental
A Comissão Intergestores Tripartite (CIT) aprovou resolução, na manhã desta quinta-feira (14), alterando a política de saúde mental ao estabelecer novas diretrizes para a Rede de Atenção Psicossocial (Raps).
Durante a reunião, o Movimento da Luta Antimanicomial fez uma manifestação de repúdio à nova política de saúde mental em frente ao prédio da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), em Brasília (DF), onde ocorreu o encontro da CIT.
Para o Conselho Federal de Psicologia (CFP), a resolução aprovada contém pontos que desfiguram a política de saúde mental e afrontam as diretrizes da política de desinstitucionalização psiquiátrica, prevista na Lei 10.216/2001. Além disso, viola as determinações legais no que se refere à atenção e cuidado de pessoas com transtorno mental estabelecidas na Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência e na Lei Brasileira de Inclusão.
Outras entidades, como a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e a Procuradoria Federal dos Direitos dos Cidadãos(PFDC), avaliam que as mudanças afrontam os direitos humanos e a reforma psiquiátrica antimanicomial adotada no país, pois limitam os recursos para unidades que trabalham com a reinserção psicossocial de pessoas.
Entre as modificações criticadas pelo CFP estão a manutenção de leitos em hospitais psiquiátricos e a ampliação de recursos para comunidades terapêuticas, instituições não promotoras de saúde, asilares, que atuam a partir do isolamento de usuários de drogas e cuja atuação não tem qualquer comprovação de efetividade na literatura de saúde.
Além disso, o plano vislumbra um redirecionamento progressivo de uma rede comunitária para um modelo baseado em instituições médico centradas, privadas, promotoras de estigma e segregação e que se mostrou historicamente ineficiente.
Mudanças antidemocráticas
O Ministério da Saúde mudou política histórica de uma rede de serviços voltada para a perspectiva comunitária, trazendo os hospitais psiquiátricos de volta para o cenário. A instituição foi abandonada por sua ineficácia e repetidas violações aos direitos humanos.
O Ministério da Saúde não está preocupado com a política de saúde mental e prefere o recorte mercantilista em detrimento da política de saúde coletiva ou de saúde pública.
Os manifestantes em frente à Opas, além de protestar contra a proposta, pediram para ser escutados pela CIT, o que foi negado pela comissão. O presidente do Conselho Nacional de Saúde, que tem direito a voz, mas não a voto na CIT, pediu a palavra, mas foi proibido de se pronunciar pelo Ministério da Saúde.
Carta do Encontro de Bauru
Nos dias 8 e 9 de dezembro de 2017, em Bauru (SP), o Encontro de 30 anos de Luta por uma Sociedade sem Manicômios aprovou nova carta, na qual reafirma que uma sociedade sem manicômios é uma sociedade democrática, uma sociedade que reconhece a legitimidade incondicional do outro como o fundamento da liberdade para todos e cada um.
Diante da atual conjuntura de avanço do conservadorismo e de redução de recursos para as políticas públicas sociais, com violento ataque ao Sistema Único de Saúde (SUS), é preciso reforçar a desconstrução do modelo asilar e combater a cada dia o manicômio em suas várias formas, do hospital psiquiátrico à comunidade terapêutica, incluindo o manicômio judiciário.
Luta antimanicomial reúne 1,8 mil participantes em Bauru
Nenhum passo atrás! Manicômio nunca mais. Essa foi a tônica dos discursos de abertura do “Encontro de Bauru: 30 anos de luta por uma sociedade sem manicômios”, na manhã desta sexta-feira (8), na Universidade Sagrado Coração, na cidade de Bauru (SP). Mais de 1,8 mil pessoas, entre usuários da saúde mental, profissionais, professores e estudantes, estão participando das atividades realizadas no campus e na cidade.
A programação do primeiro do evento foi marcada por atividades culturais e homenagens póstumas a militantes da luta antimanicomial que ajudaram a redigir a Carta de Bauru, há 30 anos. Em dezembro de 1987, trabalhadores da saúde mental reunidos em Bauru escreveram o manifesto que marca o início da luta antimanicomial no Brasil e representa um marco no combate ao estigma e à exclusão de pessoas em sofrimento psíquico grave. Com o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, o congresso discutiu as formas de cuidado com os que apresentam sofrimento mental grave e representou um marco histórico do Movimento da Luta Antimanicomial, inaugurando nova trajetória da Reforma Psiquiátrica brasileira.
O presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Rogério Giannini, ao falar sobre o cenário de retrocessos e truculências que ocorrem no país, lembrou a condução coercitiva do reitor e da vice-reitora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Jaime Arturo Ramirez e Sandra Regina Goulart Almeida por agentes federais no dia 6 de dezembro.
Diversidade e resistência
Giannini disse que a luta antimanicomial é em prol da cidadania e da democracia. “Ser antimanicomial é ser democrata, é lutar por cidadania e por direitos sociais. Vivemos momento difícil e duro, mas conhecemos nossa força e resistência em defesa da democracia.” Ele reafirmou que cada Centro de Atenção Psicossocial (Caps), cada casa de saúde, é um ponto de resistência. “Nossa diversidade é um valor que precisa ser afirmado. Somos diversos, mas somos únicos pela democracia.”
O ex-deputado Paulo Delgado, autor do projeto que resultou na Lei 10216/2001 (Lei da Reforma Psiquiátrica) recordou símbolos da luta antimanicomial, como Nilse da Silveira e Franco Basaglia. Ele destacou que a Carta de Bauru de 1987 marca uma mudança de paradigma das internações para o acolhimento e o cuidado. “Um tratamento de água com açúcar dado com amor faz mais diferença do o remédio dado com indiferença.” O político destacou ainda que os princípios da reforma psiquiátrica são os mesmos do Sistema Único de Saúde (SUS): integralidade,universalidade e equidade. “Não sou psicólogo, não sou psiquiatra, não sou assistente social, mas sou candidato a louco e, se for louco, quero ser tratado no Caps por vocês”.
Viradouro
O secretário de Saúde de Bauru, José Eduardo Fogolin Passos, explicou ser este o momento para rediscutir o conceito de saúde mental e que o foco das discussões deve ser a luta por uma sociedade sem manicômios. Ele lembrou, ainda, a dívida que o SUS tem com os movimentos da luta antimanicomial. “Tenho orgulho de ser da cidade e de conhecer a história e o movimento, como muitas dessas pessoas. Este encontro reúne novamente todos os movimentos da luta antimanicomial por uma nova sociedade, em um novo Brasil para os próximos 30 anos.” Mário Moro, representante do Encontro de Bauru de 1987, reforçou que o momento é de resistência e luta contra a diminuição nos repasses de verbas da Assistência Social.
A abertura teve representantes da Articulação Nacional do Encontro de Bauru e de movimentos da luta antimanicomial, como o Movimento Nacional de Luta Antimanicomial (MNLA) e a Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (Renila). Os representantes da articulação nacional do encontro fizeram um histórico e mostraram os desafios da luta antimanicomial. Para eles, não basta racionalizar os serviços, é preciso discutir como combater a opressão e a discriminação nas instituições e como lutar pelos direitos de cidadania e por melhores condições de vida dos doentes mentais. Revelaram que é necessário inventar novos diálogos e uma nova política pública de saúde mental.
O encontro de Bauru prosseguiu à tarde com 14 rodas de conversa atividades culturais. A Escola de Samba Viradouro, que terá a loucura como potência criadora como tema do samba enredo de 2018, encerrou o dia com um ato público na Praça Rui Barbosa.
A letra do samba enredo da Viradouro diz:“É ter na mente o dom da criação/Onde ser louco é inspiração/Une verso à melodia/Brincar de Deus… e com as cores delirar/Nos sonhos meus (…)/Sei que a loucura é o x da questão/Ser ou não ser mais um entregue à razão/Fazer do lixo uma bela fantasia/Eu sou um sonhador, um pierrô alucinado.”
Luta antimanicomial: evento em BH faz homenagem a Marcus Vinícius
Para destacar a importância da luta antimanicomial na consolidação da reforma psiquiátrica, o Conselho Federal de Psicologia (CFP), o Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG), o Fórum Mineiro de Saúde Mental e o Sindicato das (os) Psicólogas (os) de Minas Gerais vão promover, dia 30 de maio, em Belo Horizonte, o simpósio “Se o encanto me encontrar dessa vez, deixo ele entrar: uma homenagem a Marcus Vinícius e à luta antimanicomial”. O evento, que encerra as comemorações do Sistema Conselhos, será realizado às 9h30, no Museu da Imagem e do Som Santa Tereza.
Há 30 anos, em 18 de maio, 350 trabalhadores de saúde mental presentes ao II Congresso de Trabalhadores da Saúde Mental ocuparam as ruas de Bauru, em São Paulo, e fizeram a primeira manifestação pública organizada no Brasil pela extinção dos manicômios. A atitude marcou uma ruptura, pois eles se recusaram a exercer o papel de agente da exclusão e da violência institucionalizadas, “que desrespeitam os mínimos direitos da pessoa humana”.
Com o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, o congresso discutiu as formas de cuidado aos que apresentam sofrimento mental grave e representou um marco histórico do Movimento da Luta Antimanicomial, inaugurando uma nova trajetória da reforma psiquiátrica brasileira.
O manifesto diz que o Estado que gerencia os serviços de saúde mental é o mesmo que impõe e sustenta os mecanismos de exploração e de produção social da loucura e da violência. “O compromisso estabelecido pela luta antimanicomial impõe uma aliança com o movimento popular e a classe trabalhadora organizada.”
O manicômio expressa uma estrutura presente nos diversos mecanismos de opressão da sociedade, como a opressão nas fábricas, nas instituições de adolescentes, nos cárceres, a discriminação contra negros, homossexuais, índios e mulheres, esclarece outro trecho do manifesto. “Lutar pelos direitos de cidadania dos doentes mentais significa incorporar-se à luta de todos os trabalhadores por seus direitos mínimos à saúde, justiça e melhores condições de vida.”
“Se o encanto me encontrar dessa vez, deixo ele entrar: uma homenagem a Marcus Vinícius e à luta antimanicomial”
Programação
9h30 – Mesa de abertura
10h – Homenagem a Marcus Vinícius de Oliveira e Silva: leitura de poemas
10h30 – Conferência: “Cartografia da luta pela democracia no Brasil e futuros possíveis”, Peter Pál Pelbart, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Coordenação: Cláudia Natividade, presidenta do CRP-MG
11h30 – Abertura da exposição em homenagem a Marcus Vinícius e à luta antimanicomial e lançamento do livro “O avesso do niilismo: cartografias do esgotamento”, de Peter Pál Pelbart
Intervalo
13h30 – Mesa: “Quando o encanto me encontrar, deixarei que ele me alcance como um raio que me parte, o ser total que eu sou”
“O encontro com a Psicologia”, Ana Bock, professora da PUC-SP
“O encontro com a Luta Antimanicomial”, Marta Elizabete de Souza, coordenadora de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais
“O encontro com os Direitos Humanos”, Marcelo Magalhães Andrade, professor do Instituto de Psicologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e coordenador do Coletivo Balance de Redução de Danos.
Coordenação: Rogério Giannini, presidente do CFP
16h – Encerramento: Apresentação cultural dos usuários de saúde mental
O evento é gratuito e as vagas estão sujeitas à lotação do espaço.
As inscrições podem ser realizadas no local. Haverá emissão de certificados.
Informações: estagio.rp@crp04.org.br.
Se o encanto me encontrar dessa vez, deixo ele entrar: uma homenagem a Marcus Vinícius e à luta antimanicomial
Data: 30 de maio (terça-feira)
Hora: 09h30
Local: Museu da Imagem e do Som Santa Tereza, Rua Estrela do Sul, 89, Belo Horizonte, MG