sábado, 18 de janeiro de 2014

Internações compulsórias e a judicialização da saúde

Publicado em: 25/10/2013


Por  
Acadêmico de Jornalismo do CEULP/ULBRA

A eficácia da internação compulsória para usuários de drogas, principalmente o de crack, é um tema que vendo sendo amplamente discutido, mas algumas perguntas ficam no ar. Por que determinar a internação compulsória pelo simples fato de usar droga? Por que a privação de liberdade se não houve descumprimento da lei?.
A representante da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme), Márcia Caldas afirmou que a lógica de punir o usuário, em vez de tratá-lo, é equivocada, e que as alas psiquiátricas dos presídios estão lotadas de pessoas que fizeram uso abusivo de drogas. “A política pública, como está sendo empregada hoje, conta com o apoio do clamor popular e simplesmente recolhe e segrega o usuário de droga, com a nítida postura de punir. E punir não é uma forma de resolver, pois primeiro a pessoa precisa querer ser tratada”, afirmou.
De acordo com o artigo 14 da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, assinado pelo Brasil em 2006, “as pessoas com deficiência... gozem do direito à liberdade e à segurança...”. Este é um dos tópicos fundamentais porque no entendimento recente do Comitê de Acompanhamento da implementação dos direitos assegurados nesta convenção, não há nenhuma forma de tratamento forçado. Todo tratamento deve ser com consentimento e todo aquele que for forçado, será considerado uma violação.
“Isto muda o cenário de entendimento porque a internação compulsória passaria a ser uma violação constitucional, e assim o Brasil pode sofrer algumas ações das Cortes Internacionais, como já sofreu. O Brasil já foi condenado por violação dos direitos humanos, particularmente na área de psiquiatria, e a Corte Internacional esta vigilante quanto as medidas adotadas no país”, disse Roberto Tykanori, coordenador  geral de Saúde Mental do Ministério da Saúde.
No Tocantins, só na área de saúde mental a maioria das ações judiciais é voltada para a internação compulsória. Em 2013 foram registradas 175 demandas judiciais.
Para tentar avaliar e embasar o judiciário sobre as ações de saúde foi instituído em 2010 no Tocantins, o Comitê Executivo para Monitoramento das Ações da Saúde – CEMAS/TO em decorrência da crescente  demanda individualizada em busca da proteção jurisdicional dos cuidados com a saúde e reflexos em variados segmentos.
A finalidade do CEMAS/TO é enfatizar a solução extrajudicial das demandas voltadas à saúde pública no Tocantins, ou seja, em conjunto, todos nós, representantes do poder judiciário junto à Secretaria Estadual de Saúde, poderemos proporcionar maior agilidade na solução dessas questões, que atualmente são bem significativas nos atendimentos solicitados pelos assistidos na Defensoria Pública do Tocantins. Além disso, o Comitê dá a base necessária para analisar se o procedimento judicial está adequado ao caso, o que auxilia a subsidiar uma solicitação mais correta.
O Comitê é composto por representantes de vários órgãos envolvidos diretamente na problemática, dentre os quais podemos citar os magistrados do Judiciário Tocantinense e Justiça Federal, defensores públicos do Tocantins e da União, membros do Ministério Público do Tocantins e da União, gestores da Secretaria de Estado de Saúde e do Município, do Conselho Regional de Medicina, do Conselho Regional de Farmácia, da UNIMED, do Sindicato dos médicos, Advocacia Geral da União e Universidade Federal do Tocantins.

Mas até que ponto a internação compulsória ajuda no tratamento do paciente?
A judicialização da saúde de forma geral normalmente se dá em situações críticas e os operadores do direito se vêm pressionados a dar uma solução rápida. O fulano acredita que estas decisões, tomadas desta forma, acabam sendo direcionadas a indivíduos, e à medida que se vem construindo algo no ponto de vista individual, acaba desorganizando o sistema de saúde, cria desequilíbrio de recursos e ao final das contas acaba gerando uma certa injustiça. Para ele, se realmente há necessidade de se judicializar uma demanda de saúde, a ideia é que se pense do ponto de vista coletivo, ou seja, acionar os responsáveis do ponto de vista da estruturação da rede.
“O que todos nós temos que assimilar é que este processo é em longo prazo e que não há solução imediata. E a ideia de solução rápida é frustrado, gera revolta e a situação só piora em termos de rejeição e de desconfiança. Então precisamos ter muita paciência e não acreditar que em uma primeira abordagem vai resolver tudo. São processos que dependem de convencimento, de esta mente ser harmonizada, e as vezes isto demora”, afirma Tykanori.
Para o juiz de Direito e membro da Associação Juízes para a Democracia, João Batista Damasceno, a judicialização da política, das relações sociais ou da saúde é um processo pelo qual se busca por meio do Poder Judiciário a satisfação de um direito ou interesse não contemplado por quem deveria implementá-lo. “Por exemplo, ainda que o Judiciário esteja autorizando a internação compulsória de usuários de crack com fundamento em lei que autoriza tão somente a internação de pessoas acometidas de transtorno mental, não se está diante da busca do Judiciário para implementação de direitos, mas como salvaguarda para suas violações”, disse. Ele ainda complementa, “não se trata de medida em prol da saúde, mas de higienização em favor de interesses econômicos. Se o Judiciário continuar a atuar em conjunto com o Poder Executivo visando a violação dos direitos das pessoas, ao invés de garanti-los, isto poderá resultar em sério problema na sua relação com a sociedade”, finalizou.

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