sexta-feira, 20 de junho de 2014

Contratos superfaturados desviam verbas em Pirapora e Januária - Em Pirapora, festa de 100 anos pode ter superfaturamento de R$ 600 mil. Irregularidades na educação são investigadas pelo MP em Januária.

Natália JaelDo G1, com MG Inter TV 1ª Edição
Na última reportagem da série “Corrupção: Impactos de um crime”, a equipe da Inter TV Grande Minas  mostra o desvio de recursos públicos por meio de contratos superfaturados em Pirapora e Januária. Em Pirapora apenas a festa de 100 anos do município o superfaturamento pode chegar a  R$ 600 mil.
 Em um vídeo divulgado na internet, o ex-prefeito Warmilon Fonseca Braga desabafa contra uma decisão judicial para embargar a festa do centenário de Pirapora. Na época, a Justiça entendeu que que houve superfaturamento na contratação dos artistas. Apesar da interdição, Warmilon parecia convencido que o evento seria realizado. “Vamos para praça hoje. Estamos aguardando uma decisão do Tribunal de Justiça, que nunca nos faltou”, afirmou.
Na mesma noite das declarações do então prefeito, a dupla César Menotti e Fabiano fizeram um show na cidade. De acordo com um relatório do Ministério Público, a prefeitura pagou pelo show da dupla R$ 160 mil, ou seja, R$ 20 mil a mais que o valor cobrado pelos cantores. Ainda de acordo com os promotores, em todas as contratações houve superfaturamento.
Warmilon Braga está preso e aguarda julgamento. (Foto: Reprodução/Inter TV)
Warmilon Braga está preso e aguarda julgamento.
(Foto: Reprodução/Inter TV)
Warmilon Braga foi preso e aguarda julgamento na Penitenciária Nelson Hungria, em Belo Horizonte. Em 16 anos, Warmilon Braga administrou duas cidades diferentes. Em 1996, quando foi candidato pela primeira vez em Lagoa dos Patos, ele entregou uma declaração de bens no valor aproximado de R$ 5 milhões. Em 2008, então candidato à prefeitura de Pirapora, Warmilon declarou possuir patrimônio aproximado de R$ 31,4 milhões.
“Existe uma investigação que está sendo presidida em Belo Horizonte pelo grupo especial de promotores do patrimônio público que o objetivo é apurar a evolução patrimonial do ex-prefeito de Pirapora”, explica a promotora Graziele de Resende.
Desvios em Januária afeta a educação
Em Januária, entre 2004 e 2010 a cidade teve sete prefeitos em consequência da corrupção. Em 2002, um convênio entre a prefeitura e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) foi assinado para a construção de 1.560 banheiros para moradores carentes. Uma das beneficiadas foi a dona de casa Cleuza Maria, que afirma que a obra foi realizada em curto prazo e com estrutura precária. “O alicerce foi raspado com a enxada, levantou o alicerce e colocou tijolo. Foi feito ‘nas carreiras’ e não ficou uma obra boa. Dentro de 15 a 30 todo mundo tinha seu banheiro”, afirma.

O Ministério Público apontou também irregularidades na construção da primeira Estação de Tratamento de Esgoto da cidade. O dinheiro foi enviado pela Funasa, mas onde deveria ter sido construída a ETE existe apenas mato. Por causa do atraso no investimento em saneamento básico na cidade, apenas 17% da cidade tem esgoto tratado.
MP investiga fraudes em reformas de escola de Januária. (Foto: Reprodução/Inter TV)
MP investiga fraudes em reformas de escola de
Januária. (Foto: Reprodução/Inter TV)
Irregularidades na educação também são investigadas pelo MP. Na escola Municipal de Araçá, a 70 quilômetros do centro da cidade, tem 94 alunos. Uma obra de reforma deveria ter sido concluída em 2012, mas quase nada ainda foi feito. O pouco realizado comprometeu o prédio antigo e metade da escola precisou ser interditada, inclusive os dois banheiros. Isto força os alunos a improvisarem para atenderem as necessidades fisiológicas.
“É ruim por que a gente tem que rodear lá atrás e atrapalha a aula”, lamenta o estudante Arthur Gonçalves.

“É ruim demais porque passa menino  lá e vê  a gente. Isso é uma vergonha. Até tem banheiro, mas  estão interditados e só tem um funcionando”, reclama a aluna Tainá Oliveira.
A instalação elétrica ficou abandonada e parte da escola está sem luz. Os alunos estudam em salas escuras. “Quando está nublado então fica péssimo para enxergar. É preciso abri porta, mas quando tem ventania fico com medo de desabar tudo. É preciso ter muita força de vontade para estudar porque se fosse apenas vir para escola não viria, mas tem que estudar”, afirma a estudante Tatiane Oliveira.
O forro de algumas salas caiu e parte do material que deveria ser usado na reforma está abandonada e estragando. A escola possui apenas uma torneira com saída de água para uso dos alunos, na limpeza da escola e para fazer a merenda. Descaso e abandono que entristecem a diretora. “Nós perdemos alunos por causa disso. Muitos saíram e foram para outras escolas. Dá muita tristeza, porque os alunos vêm de longe, acordam quatro horas da manhã para vir estudar e chegam aqui e acham a escola desse jeito”, diz a diretora Ana Gonçalves.
Relatório do Conselho de Educação mostra que 78% do valor destinado à reforma da escola foi pago para a empresa que venceu a licitação, mas como a obra está abandonada o antigo bar da comunidade foi alugado para abrigar os alunos do oitavo ano.
Na escola do Areão, a situação não é diferente. No local, as janelas foram instaladas sem vidros; uma fossa foi aberta e não concluída, o que gera riscos para as crianças; e parte do prédio antigo da escola caiu e os alunos brincam nos escombros. A reforma deveria ter ficado pronta em agosto de 2012. “Isso é falta de compromisso. O dinheiro vem e a gente acha que vai acontecer da melhor forma e agora a gente vê essa situação que aí está”, afirma a diretora Isabel Mota.
Andreia Aparecida afirma que 16 obras de escolas de Januária apresentam irregularidades. (Foto: Reprodução/Inter TV)
Andreia Aparecida afirma que 16 obras de escolas
de Januária apresentam irregularidades.
(Foto: Reprodução/Inter TV)
De acordo como Conselho Municipal de Educação, 16 obras de escolas de Januária apresentam irregularidades. Entre elas estão três centros de educação infantil, que deveriam ter sido construídos, mas não foram. “A gente foi encontrando um cemitério de obras abandonadas e a documentação como os empenhos provam que o dinheiro foi liberado. Então fomos ficando cada vez mais preocupadas e decepcionadas com a falta de responsabilidade com a gerência de recursos públicos”, afirma a presidente do Conselho Municipal de Educação, Andreia Aparecida.
Pagamento antecipado
A empresa AF Construtora, de Montes Claros, é a responsável por parte das obras nas escolas. O contrato para reforma da escola de Areão foi assinado no dia 09 de dezembro de 2011 pelo então secretário de educação Alexandre de Sá Rêgo e por um dos sócios da empresa, Fabiano Ferreira Durães. Documentos apresentados pelo Conselho, mostram que 19 dias após a assinatura do contrato, a empresa emitiu uma nota com o valor acima de R$ 143 mil de um talão de notas vencido há quase um ano e, mesmo assim, no dia 28 de dezembro o pagamento foi liberado.

Nesta mesma época o laudo do engenheiro atestou que as obras estavam praticamente concluídas, inclusive a fossa que custou R$ 1,5 mil e hoje não passa de um buraco no chão. Outro fato chama atenção; a data que consta na placa colocada na escola mostra que a obra só foi começar quase dois meses depois de ter sido paga. “Como essa empresa já está sendo denunciada por fraude em licitação, a suspeita é que ela tenha fraudado licitações e contando com apoio de alguns agentes públicos e até mesmo recebendo adiantado por obras que ainda seriam executadas o que favorece e muito o desvio”, afirma o promotor de justiça Franklin Reginato.
Promotor suspeita que tenha ocorrido fraudes nas licitações em Januária. (Foto: Reprodução/Inter TV)
Promotor suspeita que tenha ocorrido fraudes nas
licitações em Januária. (Foto: Reprodução/Inter TV)
Segundo cálculos da Justiça, nos últimos quatro anos a AF Construtora venceu licitações que juntas somam cerca de R$ 20 milhões somente em Januária. Os promotores vão apurar porque algumas apresentaram preços altos, como o calçamento de ruas na entrada da cidade, onde foram gastos quase R$ 3 milhões. “Essas obras estão sendo investigadas porque a empresa que executou essas obras é a mesma que executou boa parte das obras das escolas”, completa o promotor Franklin Reginato.
As irregularidades envolvendo educação foram realizadas durante o mandatodo ex-prefeito Maurílio Arruda, que foi preso suspeito de fraude na execução do programa Projovem Trabalhador, ele nega que sabia dos contratos e do pagamento adiantado. “Eu não sabia, até pelo contrário porque isso é proibido por lei.  A liberação desses reucuros não foi da minha pessoa, isso eu posso afirmar. Quem pode autorizar é o ordenador de despesas que é o secretário”, afirma o ex-prefeito.
Enquanto isso, em buscas de respostas, a população se mobiliza contra o desvio de dinheiro público. “Hoje a agente ainda não se sente segura sobre o resultado depois de tanto tempo, mas temos esperança e vamos continuar fiscalizando e cobrando para que as coisas deem certo”, afirma a presidente do Conselho de Educação de Januária.
“Em situação de corrupção que Januária vive deveria ser um incentivo para as se envolverem cada vez mais com as questões políticas. Querer saber quem são os candidatos, qual o passado deles, se ele é que você espera para te representar porque os reflexos vão vir nos quatro anos seguintes”, afirma a promotora de justiça, Daniela Yokoyama.
O que dizem os envolvidos
Warmilon Fonseca Braga, está preso na penitenciária Nelson Hungria em Contagem e quem falou sobre o assunto foi a esposa de dele, Marcela Machado Ribas. Ela informou que os shows do aniversário da cidade foram pagos com recursos da iniciativa privada. Segundo ela, o cálculo feito pelo Ministério Público, que possibilitou a conclusão do superfaturamento, não levou em conta todos os gastos. Ainda de acordo com Marcela, a defesa acredita na modificação da sentença dada a Warmilon.
Quanto ao patrimônio a esposa do ex-prefeito disse que a maior parte dos bens de Warmillon foram adiquiridas em datas anteriores ao exercício de cargos públicos. Ela destacou que a diferença de valores entre a primeira declaração de renda se deve a atualização dos valores dos bens.
Já em januária, o Ministério Público isenta a Funasa sobre má aplicação dos recursos do convênio firmado para a instalação de banheiros no município.
Sobre a situação das escolas, o secretário de Educação de Januária, da época,  Alexandre de Sá Rego negou que a prefeitura tenha pago à Construtora AF antecipadamente. O ex-secretário disse que houve um remanejamento de verbas de uma escola para outra, porque para algumas instituições onde  a empresa já estava trabalhando, o recurso já estava liberado a tempo. Ele disse ainda que no fim de 2012 o município acionou a construtora na justiça para que ela concluísse as obras.
A presidente do conselho municipal de educação, Andreia Aparecida, informou que por orientação da perícia as reformas e ampliações nas instituições não puderam continuar nem serem alteradas.
Ninguém da AF Construtora foi encontrado.

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