segunda-feira, 27 de julho de 2020

Violência contra o idoso quintuplicou durante pandemia

Foto: Divulgação

As denúncias de casos de violência contra a pessoa idosa mais do que quintuplicaram de março até maio, aponta levantamento do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Segundo Antonio Costa, titular da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (SNDPI), os casos passaram de cerca de 3 mil, em março, para quase 17 mil, em maio.

– No começo de março tivemos 3 mil denúncias. Em abril, esse índice passou para 8 mil e, em maio, foi para quase 17 mil. Isso se dá devido ao isolamento social, ao convívio maior desses idosos que estão em casa, são pessoas vulneráveis e, por isso, esse aumento de denúncia – afirmou, em nota.

Se, por um lado, a quarentena evita que os idosos, maior grupo de risco, sejam contaminados pela Covid-19, ela também aumenta a exposição deles aos familiares, que costumam ser os principais agressores das pessoas mais velhas (em 2019, foram responsáveis por 83% dos casos).

O efeito “isolamento social” fica ainda mais visível na comparação histórica: de 2011 até 2018, a média de aumento das denúncias entre março e maio não chegou a 20%. Bem abaixo dos mais de 500% registrados em 2020. Além disso, o valor de maio deste ano é mais do que o dobro de todas as denúncias registradas em 2011 no país.

Em 2019, aumento de 29% nos casos

Em todo o Brasil, a violência contra os idosos também teve aumento de 29% em 2019 no Brasil, com 48,5 mil registros recebidos pelo Disque 100, aponta a cartilha “Violência contra a pessoa idosa: vamos falar sobre isso?”, do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos divulgada nesta segunda (15), Dia Mundial de Conscientização da Violência Contra a Pessoa Idosa, data estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). No mundo, segundo a instituição, um em cada seis idosos sofre violência.

As denúncias de violações contra pessoas idosas no Brasil vêm crescendo desde 2018, quando foram registrados 37.454 casos, aumento de 13% em relação ao ano anterior. A grande maioria dos denunciados são familiares: mais de 80% dos casos.

Segundo a assistente social Sandra Rabello, membro do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa e mestre em Psicanálise, Saúde e Sociedade, o número de denúncias representa apenas parte do problema, já que a maioria das pessoas mais velhas não denuncia:

– Nós sabemos que o idoso não costuma denunciar, pois há um medo de que aquele familiar será preso, o que não é necessariamente verdade. É preciso ampliar a informação sobre os meios e canais de denúncia e também sobre os centros de apoio e acolhimento das vítimas de violência no país.

As violações mais comuns são: negligência, violência psicológica, quando há gestos de humilhação, hostilidade ou xingamentos; e a violência patrimonial, que ocorre quando o idoso tem seu salário retido ou seus bens destruídos. Segundo a especialista, são diversos os fatores que levam familiares a cometerem esse tipo de ação, que vão desde a falta de políticas públicas de apoio até a exaustão e a dependência financeira:

– Muitas famílias do Brasil dependem da aposentadoria. Em alguns casos, membros das famílias se utilizam da fragilidade do idoso praticando violências que vão desde o sequestro da renda mesmo até fraudes com cartão de crédito e empréstimos consignados, por exemplo. Já no caso da negligência e das violências psicológicas e físicas, há a questão do cuidado de que muitos idosos precisam e que dependem dos familiares. Muitos não têm formação, paciência ou disponibilidade para isso, o que pode levar aos casos de maus tratos. A falta de serviços de saúde públicos voltados para os mais velhos, em que eles não dependam tanto assim dos parentes, contribui muito para piorar o problema.

Durante a pandemia da Covid-19, a situação da saúde dos idosos brasileiros é tema constante, afinal eles são o principal grupo de risco para desenvolver a forma mais grave do coronavírus, como também destaca a especialista.

– A pandemia colocou a saúde do idoso e o resgate de investimentos e políticas públicas para este segmento em destaque, o que é uma coisa importante e que não se debatia tanto antes. O desenvolvimento de políticas e de discussões acerca do envelhecimento da população e da proteção de direitos dos idosos, garantida na Constituição, também entrou em debate, já que eles são as maiores vítimas da Covid.

Segundo o geriatra Ivan Abdalla, a assistência à saúde da Família, que vem sofrendo cortes nos últimos anos, também dificulta o acesso da população idosa aos serviços garantidos pela Constituição:

– Muitas pessoas mais velhas têm dificuldade, por exemplo, de locomoção, por conta de problemas de saúde mesmo, como artrose, e até econômicos, por falta de dinheiro para o transporte. E vários moram sozinhos, não têm a quem recorrer. Isso era uma lacuna que era preenchida, em parte, pela Saúde Primária, que atuava nos bairros diretamente, mas que não vem sido mantida.

Estatuto do Idoso foi avanço no país

No Brasil, o Estatuto do Idoso, que completa 17 anos em outubro de 2020, foi um importante marco na proteção dessa população, que representa cerca de 15% dos brasileiros e que deve chegar a 25% nos próximos dez anos. Estima-se que, em 2039, pessoas acima dos 60 anos serão mais numerosas do que as crianças por aqui. É o segmento populacional que mais cresce no país. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, do IBGE.

– Esse estatuto foi fundamental na garantia dos direitos das pessoas acima de 60 anos, pois estabeleceu e assegurou diretrizes de proteção social, políticas públicas em diversas áreas, como da Saúde, por exemplo.

A queda de investimento no Sistema Público de Saúde (SUS) prejudica muito o acesso e a oferta de serviços de apoio e acolhimento ao idoso que sofre de violência, como os Centros de Referência em Assistência Social. É preciso ampliar não só esses serviços, mas também a informação correta para que essa população conheça os meios para denunciar seus violadores, sem medo.

Segundo o governo, o Disque 100, o aplicativo Direitos Humanos Brasil e o site da Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos oferecem serviços gratuitos e funcionam 24 horas por dia, inclusive em feriados e finais de semana para receber denúncias e dar orientações. (Ig)


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