Comissão Parlamentar de Inquérito da Máfia das Órteses e Próteses ouviu nesta quinta-feira (25) os irmãos médicos Gerson Miranda e Zandonai Miranda, investigados pelo Ministério Público Federal e Polícia Federal, em Montes Claros (MG), por envolvimento em um esquema de fraudes ao SUS e recebimento de propina. A CPI esteve na cidade no dia 18 deste mês, mas os cardiologistas não prestaram depoimento sob a alegação de que estavam em outro local, e não voltariam a tempo para o Norte de Minas.
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Os cardiologistas foram presos na operação "Desiderato", realizada em MG, SC, SP e RJ. Eles trabalhavam em hospitais de Montes Claros na área de Hemodinâmica. Apenas na cidade, o prejuízo aos cofres públicos chega a R$ 5 milhões, afirmam o MPF e a PF.
Os médicos já estão em liberdade, mas permanecem impedidos de prestar serviços ao SUS. Na ocasião, a Justiça expediu 72 mandados, sendo oito de prisão.
O depoimento dos irmãos durou cerca de duas horas, os áudios foram disponibilizados no site da Câmara dos Deputados. Na maioria dos questionamentos feitos pelos deputados, os investigados alegaram que, por orientação da defesa, iriam permanecer calados. Ambos disseram que trabalhavam exclusivamente na Santa Casa.
Depoimento de Zandonai Miranda
Zandonai Miranda foi ouvido primeiro e afirmou que fez faculdade de Medicina no Rio Grande do Sul e se especializou na área de Cardiologia em Belo Horizonte. O processo de formação, de acordo com ele, durou 11 anos.
O cardiologista explicou para os deputados que os procedimentos realizados pela Hemodinâmica são "minimamente invasivos, rápidos e feitos em larga escala". “Me considero uma pessoa que tentou fazer o melhor possível, porque estamos falando de um universo de 10 a 15 procedimentos, sendo que no período investigado, foram feitos mais de sete mil.”
Zandonai Miranda esclareceu que realizava os procedimentos conforme as decisões de uma equipe formada por vários especialistas do hospital. Ele disse que participava destas reuniões, nas quais era analisada também a indicação do material que se enquadrava nas necessidades de cada um dos pacientes.
“Quem é médico e tem a oportunidade de vivenciar o hospital, sabe que todo o controle de material, seja de pequena ou médio porte, é feito pelo hospital. Bem como a escolha de qual empresa vai fornecer este material”, falou Zandonai.
Apesar da afirmação, algumas situações investigadas na operação Desiderato mostram, segundo o MPF e a PF, que cirurgias desnecessárias eram realizadas e que havia a simulação de procedimentos, por meio da confecção de laudos com informações falsas. Os órgãos afirmam ainda que havia desvio de materiais pagos pelo SUS, que formavam um “estoque paralelo”, posteriormente utilizado nas clínicas particulares dos profissionais. Cerca de R$ 300 mil de materiais desviados foram apreendidos, alguns estavam vencidos.
O cardiologista preferiu não responder quando questionado se tinha alguma relação direta com as empresas Biotronik e Signus, fornecedoras de produtos farmacêuticos e hospitalares, e que são apontadas pelo MPF e PF como os pilares do esquema criminoso, já que elas sustentavam as irregularidades com o pagamento de proprina. Um diretor e um sócio delas foram presos. Zandonai disse apenas que ambas são conhecidas por todos os médicos hemodinamicistas e são líderes no mercado mundial.
Segundo a Polícia Federal, cada um dos profissionais recebia R$ 500 ou R$ 1 mil de propina destas empresas por stent - tubos utilizados para desobstruir artérias, faturado. Em apenas três anos um deles ganhou R$ 1,5 milhão.
Durante as investigações, o MPF e a PF afirmaram ter identificado que os investigados criaram uma empresa de fachada, a Angiomoc, que estabelecia contratos deles com as fornecedoras de materiais médico-hospitalares. Os acordo eram feitos para que eles tentassem simular a legalidade das “bonificações” recebidas. De forma geral, de acordo com o MPF, a remuneração era paga a título de consultorias, o que foi confirmado por dois profissionais que colaboraram com as investigações.
Zandonai disse que a empresa existe há cerca de 10 anos e que tem um endereço e funcionários. Um dos parlamentares questionou se os R$ 5 milhões apreendidos em uma conta bancária são dele, o médico respondeu que não. No total, a Justiça bloqueou R$ 17 milhões.
Depoimento de Gerson Miranda
Depois de Zandonai Miranda, a CPI ouviu o irmão dele, Gerson Miranda. Ele afirmou ter 54 anos, disse que se formou em Medicina em uma faculdade de Belo Horizonte (MG) e fez diversas especializações. Falou também que atuou como coordenador da Hemodinâmica e Cardiologia da Santa Casa, além de exercer atividades docentes com alunos e residentes de Medicina na Santa Casa de Montes Claros.
A primeira pergunta feita ao médico foi se ele considerava que havia sido preso de forma arbitrária. Ele disse que sim e estendeu a afirmação para o irmão. “Fui buscado em casa sem direito de defesa, de surpresa. Não sabia do que se tratava e que havia qualquer tipo de investigação a meu respeito”.
Quando questionado sobre o pagamento de propina para médicos e sobre o superfaturamento de cirurgias, afirmou que iria permanecer calado.
“Prestamos serviços médicos, não compramos, comercializamos, estocamos ou vendemos qualquer produto, só o nosso serviço médico. Quem faz toda esta parte é o hospital, por intermédio de seus agentes”, destacou.
Um dos depoimentos colhidos durante a investigação mostra o caso de uma família que pagou R$ 40 mil por procedimentos realizados pelo irmão dele e que tinham o custeio do SUS. O valor foi pago e o homem morreu. Na época, Gerson era o responsável pela Hemodinâmica.
O médico disse que foi o responsável por comunicar o afastamento ao irmão Zandonai Miranda, depois que ele foi investigado por uma comissão interna. Sobre a conduta do irmão, falou que não participou do julgamento e não tinha opinião para emitir.
Gerson Miranda também afirmou que os R$ 5 milhões encontrados em uma conta bancária não são dele.
O que dizem os envolvidos
Tanto o MPF quanto a PF afirmaram que, apesar dos médicos já terem trabalhado em dois hospitais, as instituições de saúde estão na condição de vítimas.
Representantes das empresas Biotronik e Signus disseram que estavam colaborando com as investigações e que iriam apurar supostas irregularidades.
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