Indígenas e famílias não-índias disputam com milhares de urubus carcaças e restos bovinos lançados todos os dias no Lixão de Sena Madureira. A cena se repete com maior freqüência na parte da tarde, quando caminhões dos matadouros despejam ossadas e vísceras no portão de entrada, sem qualquer vigilância ou cuidado por parte da prefeitura, responsável pelo local. Seringas e outros instrumentos cirúrgicos utilizados no hospital da cidade são visto a olho nu entre as toneladas de dejetos. As famílias perambulam descalças e manipulam todo o lixo sem proteção nas mãos.
A reportagem foi recebida a pedradas. Os índios, mais incomodados com a presença do repórter, escondem-se atrás das montanhas de entulhos e usam caixas de papelão para encobrir o rosto. Crianças e adolescentes são maioria entre eles, sempre acompanhados de uma mulher mais velha, que aparenta ser a mãe. Os catadores chegam minutos antes dos caminhões. “Eles catam brinquedos quebrados, roupas, lençóis, recipientes plásticos e peles de boi. Com sorte, é possível levar pra casa um bocado de carne boa”, diz Gabriel renado da Silva, cuidador de uma fazenda próxima do lixão.
Com certa habilidade, os catadores usam pedaços de madeira e outros instrumentos cortantes para separar as vísceras da carne que pode ser aproveitada. O lixo coletada na cidade também é deixado junto às carcaças, a poucos metros da guarita que sempre permanece vazia. A revoada de urubus ameaça o trânsito na BR-364. No lugar, não há sinalização e o mau cheiro gera críticas de quem passa por ali. “Vergonha. Isso nunca mudou. Nossa cidade está entregue a políticos safados”, disse a ciclista Damiana Soares.
O lixão de Sena Madureira foi alvo de inúmeras denúncias da imprensa. Há décadas a situação só piora. O Ministério Público, até hoje, foi incapaz de obrigar o poder público municipal a cumprir a lei de resíduos sólidos. Recentemente, o ex-prefeito Nilson Areal foi preso, mas por outros motivos (crime de responsabilidade).