Houve um tempo, no Brasil e no resto do mundo, em que as pessoas tidas como “diferentes” eram excluídas do convívio social. Eram loucos, bêbados, pessoas com doenças venéreas, prostitutas, militantes políticos. Qualquer pessoa que não se enquadrasse nas normas poderia ser posta em grandes manicômios, locais onde esses indivíduos “diferentes” provavelmente permaneceriam por longos anos, 10, 30, 40 anos, ou quem sabe a vida inteira. Na Europa, houve até um tempo em que, as pessoas não desejadas eram colocadas em grandes embarcações e soltas em alto-mar – era a chamada Nau dos Loucos. Os hospitais psiquiátricos foram, por muito tempo, a única opção para quem era acometido por um transtorno mental. Eles se tornaram grandes máquinas de fazer dinheiro no Brasil, principalmente na época da ditadura militar. E onde entra o desejo frenético pelo lucro, entram os maus tratos e as milhares de mortes por fome, frio e outras violências, praticadas por quem deveria oferecer cuidados.
Várias experiências ao redor do mundo aconteceram no sentido de oferecer às pessoas com transtorno mental uma melhor qualidade de vida. França, Inglaterra e Estados Unidos foram países que tentaram melhorar a qualidade dos serviços oferecidos. Porém, foi na Itália, em duas cidadezinhas chamadas Gorizia e Trieste, onde aconteceu uma verdadeira revolução. Os hospitais psiquiátricos tiveram suas portas abertas. Todos os pacientes saíram. Passaram a habitar a cidade. A revolução, porém, chamada de Reforma Psiquiátrica, não se deu sem preparo e a “toque de caixa”. Os políticos aprovaram leis e financiamento adequado, os médicos saíram de seus lugares de rei e passaram a tratar o paciente como sujeito ativo no processo terapêutico, ouvindo e respeitando desejos, toda a equipe de profissionais de saúde passou a ter a mesma importância – do médico ao técnico de enfermagem, toda a comunidade ao redor passou a compreender que todos têm direito de ir e vir. Assim, o louco voltou para casa. Aqueles que não tinham condições foram pros lares abrigados que eram pequenos apartamentos, com poucos moradores saídos dos hospitais, que ficavam sob os cuidados das equipes de saúde. E foram pra casa, e para a padaria, e para o trabalho, e para a livraria, e para a praça, enfim, voltaram à vida.
No Brasil, essa experiência italiana chamou bastante atenção. Vieram médicos e outros personagens importantes contar a história pra gente. Foi quando, no início da década de 1980, funcionários de um hospital psiquiátrico no Rio de Janeiro denunciaram os maus tratos, torturas e as diversas mortes por fome e violência que vinha ocorrendo naquele espaço. Perceberam que outras formas de cuidados era possível, sem exclusão, sem quebra de vínculos e com mais dignidade e respeito à vida. Este movimento ficou conhecido como Luta Antimanicomial. Em 2001, foi sancionada no Brasil a Lei 10.216, a Lei Antimanicomial, que regula a Reforma Psiquiátrica Brasileira, redireciona o modelo de assistência: da exclusão à inclusão social, fechando gradativamente leitos psiquiátricos e abrindo serviços substitutivos de base comunitária. Hoje, contamos com os CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), Serviços Residenciais Terapêuticos, Leitos Psiquiátricos em Hospitais Gerais, Centros de Convivência (este último ainda não existe em Pernambuco). Internação deixou de ser a primeira opção de tratamento e tornou-se a última, quando todas as outras tentativas não tiveram sucesso e a pessoa ainda continua em sofrimento mental.
O Dia Nacional de Luta Antimanicomial acontece no dia 18 de maio. Essa data foi escolhida para lembrar a luta dos trabalhadores que se uniram para fazer denúncias sobre os hospitais psiquiátricos e exigir melhores condições de tratamento. Nesse dia, por todo o Brasil, acontecem manifestações de trabalhadores, usuários da Rede Substitutiva e familiares, exigindo melhorias nos serviços oferecidos, além do fechamento dos leitos ainda remanescentes no país, lembrando que a Liberdade é Terapêutica.
Em Pernambuco, acontecerá a III Semana Antimanicomial, em comemoração ao Dia Nacional de Luta Antimanicomial, com Seminário, Cine-Debate, Intervenções com a população e uma caminhada (PasseATO) que ocorrerá no dia 18/05/15, com concentração às 8h, no Parque Treze de Maio. A programação completa está disponível na página do facebook do /Libertando Subjetividades.
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