O aumento da densidade construída, da altura dos edifícios, do potencial edificado dos terrenos é certamente um dos capítulos mais polêmicos de qualquer mudança na legislação urbanística de uma cidade. Tal polêmica se dá porque atinge diretamente os interesses econômicos e acredito ser legítimo.

Mas deixemos as questões econômicas um pouco de lado agora. Vamos falar sobre a qualidade urbana. Para isso olhemos para a chamada “cidade original”. Aquela que visitamos quando vamos para a Europa. Cidades que fazemos registros fotográficos, especialmente referente a dinâmica que elas produzem. Cidades que nos permitem deslocamento a pé e quase não se preocupar com os carros nos atravessamentos. A sensação de que o espaço foi desenhado para o pedestre nos faz sentir liberdade, segurança, aconchego. E a pergunta que fica é: os comércios não vendem? As pessoas não moram nestes locais? Vendem e moram. Nós mesmos já pensamos em ter um negócio toda vez que vamos visitar estes locais. Adoramos um “airbnb” nestes endereços, pois fica perto de tudo.

Bem, e o que isso tem a ver com a verticalização? Tudo!!! Percebam como tudo nestas cidades está mais próximo. Os prédios estão mais juntos e os terrenos mais ocupados? Claro que não estou falando de espigões verticais que parecem furar o céu. Estou falando de uma densidade equilibrada como podemos conferir em Barcelona, por exemplo, uma das cidades mais compactas que eu já estudei.

Sim, eu acredito que cidades mais compactas, ou seja, mais densas tem a ver com qualidade de vida. É claro que não falo em verticalizar por verticalizar. Tudo tem uma lógica. Mas não é a lógica da “cidade jardim” proposta por Ebenezer Howard nos final do século 19. Ele propunha uma cidade com grande terrenos e muito verde, necessitando de grandes áreas para abrigar uma pequena quantidade de pessoas.

Estou lendo o livro do queridíssimo Caio Esteves intitulado Place Branding. Entre muitas coisas maravilhosas, em algumas páginas ele citando alguns autores, diz que: “os edifícios precisam ser pensados como pequenas cidades e, deste modo, eles devem ser organizados e projetados. Quanto mais pessoas estes edifícios atraem, mais sua organização deve ser como de uma cidade, ou seja, as áreas devem ser pensadas para a socialização urbana e devem assumir um protagonismo inequívoco na organização geral dos espaços urbanos”. Ele também comenta que além de um bom “relacionamento” entre o prédio e a parte externa, internamente também deve ter uma organização de forma a permitir a interação entre as pessoas.

Quero dizer que verticalizar é necessário para melhorar a qualidade de vida, pois acredito que ajuda a promover a interação entre as pessoas. As pessoas somente interagem se estiverem próximas. E não estou falando apenas de espaços comerciais, falo da mistura entre todas atividades urbanas o mais próximo possível.

Como engenheira civil fui ensinada que quanto maior as vias, melhor. Mais espaço é melhor. Faz pouco tempo que mudei este ponto de vista. Especialmente depois que visitei alguns empreendimentos e cidades nos EUA. Ver vias largas e desabitadas me chocou. Não conseguir identificar a face da pessoa do outro lado da via me causou uma sensação de solidão e até mesmo de medo…quem estará do outro lado? Mudei minha forma de ver a cidade e especialmente a considerar a “cidade original” como a mais saudável para as relações humanas e para os negócios.

A amiga, pesquisadora, arquiteta e urbanista Maria Augusta Hermida da Universidade de Cuenca no Equador citou em uma de suas palestras a pesquisa feita com dois edifícios construídos com a mesma área, porém um deles tinha espaços de convivência em cada andar e o outro, tinha uma área de convivência grande concentrada em um andar. Comentou que o primeiro mantinha mais tempo as salas alugadas e tinha fila de espera para novos inquilinos. O segundo nunca se manteve 100% locado e tendia sempre ao esvaziamento.

O que quero dizer com isso é que não falo em verticalizar por verticalizar. Há muita responsabilidade entorno disso. É preciso considerar a mobilidade e a capacidade de suporte da infraestrutura urbana. Em Vancouver no Canadá, que visitei recentemente, o limite de altura é dado pela oferta de transporte público. É ou não um bom critério? Eu considero que sim. Mas o mais importante, é preciso gerar PERTENCIMENTO. Gerar identidade. Segundo Caio Esteves, gerar pertencimento é: “…partilhamento de características, de experiências e de vivências entre membros da comunidade”.

Sim, queremos cidades mais verticais e por consequência mais eficientes, mas queremos que seus construtores sejam mais estratégicos e gastem mais tempo com seus projetos, com o branding da construção. Não construam apenas novos metros quadrados e sim construam o LUGAR!

Acredito que o importante para alcançar este propósito é o máximo debate entre poder público e população, mas sempre compreendendo o território a partir do que já está construído e planejando melhorias a partir deste diagnóstico. Abrir a cabeça e não “bater o pé” em pontos de vista fixos é o caminho para a fluência deste debate saudável e necessário.