domingo, 12 de abril de 2020

Curado e de volta ao trabalho, médico diz que Covid-19 mudou a vida dele; 'primeira vez que a morte passou pela cabeça'

Herisson quer se especializar em neuropediatria — Foto: Herisson Henrique / Arquivo Pessoal
Herisson quer se especializar em neuropediatria — Foto: Herisson Henrique / Arquivo Pessoa

Natural de Montes Claros (MG), Herisson Henrique se mudou para São Paulo há 10 meses com os objetivos de trabalhar e continuar estudando. Ele atende em um posto de saúde e faz plantões em um hospital da capital paulista.


Curado da Covid-19 e já de volta ao trabalho, um médico mineiro diz que a doença mudou a forma como ele encara a vida e reforçou a escolha da Medicina como profissão. “Foi a primeira vez que a noção de morte passou pela minha cabeça”, fala Herisson Henrique, de 35 anos.

“A patologia despertou nas pessoas uma consciência sobre a importância do autocuidado. Estamos pensando mais em ser do que ter, em sermos pais melhores, filhos melhores e profissionais melhores. É um momento para pensarmos em nós e nos outros. Penso que precisamos refletir também sobre como o consumismo nos leva a valorizar demais o que é supérfluo”, observa.


Natural de Montes Claros (MG), ele se mudou para São Paulo há 10 meses com os objetivos de trabalhar e continuar estudando. O médico atende todos os dias em um posto de saúde e dá plantões duas vezes por semana no pronto-socorro de um hospital.
Antes de ser infectado, Herisson atendeu pacientes com sintomas da Covid-19. Apesar de tomar todos os cuidados e usar a paramentação, o médico diz que sabia dos riscos de pegar a doença, mas essa possibilidade jamais o impediria de seguir com a missão que escolheu para a vida, cuidar das pessoas.


“Inicialmente, me senti como paciente e pensava no que iria acontecer e, principalmente, em quando os sintomas iriam passar. Já melhor, minha vontade era de voltar o quanto antes ao trabalho, já que os colegas e os pacientes poderiam estar precisando de ajuda.”

Infecção pela Covid-19
Herisson Henrique conta que a dor no corpo, primeiro sintoma da infecção pelo coronavírus, surgiu quando ele estava trabalhando no posto de saúde. Já em casa, teve febre e dor de cabeça intensa de madrugada.

“Quando amanheceu, fui ao posto, sabia que iria ser tratado pelos colegas. Já sentia um desconforto respiratório e apresentava dispneia. Fizeram a coleta de exame para Covid-19 e me levaram para um hospital, onde fizeram também raio-x. A imagem tinha o padrão de pacientes com coronavírus. Comecei a piorar e decidiram me encaminhar para outro hospital. Fiz um tomografia, tive que ser medicado e fiquei em isolamento até o dia seguinte”, conta.

Como a segunda unidade de saúde não tinha leitos disponíveis e, para evitar que o médico contraísse uma infecção, ele foi liberado para cumprir a quarentena em casa.

“Quando retornei, tive uma melhora, mas no quarto dia todos os sintomas vieram com o dobro da força. Liguei para meus colegas médicos, que passaram orientações. Eu recebia ligações de hora em hora, para não ficar sem atendimento”, fala.
Impossibilitado de sair de casa e morando sozinho, o médico contou com a solidariedade dos "anjos", como são chamados os moradores do condomínio onde ele mora que ajudam pessoas infectadas ou que fazem parte do grupo considerado de risco. Eram os anjos que iam supermercado e deixavam as compras na porta dele.

Após cumprir a quarentena e não apresentar mais nenhum sintoma, Herisson Henrique foi considerado curado e teve autorização para voltar ao trabalho. Ele faz um apelo para que as pessoas respeitem as orientações das autoridades de saúde.


“Não temos informações de que um determinado público é mais propício a pegar a doença. O que sabemos é que em idosos, gestantes ou pessoas que já possuem outras doenças os riscos e a letalidade são maiores. É um consenso mundial de que a quarentena precisa ser levada em consideração por todos. Precisamos olhar para as autoridades e órgão de saúde com a seriedade que merecem”, destaca o médico.

'Estamos aqui para servir aos outros'

Herisson com os irmãos e a mãe — Foto: Herisson Henrique / Arquivo Pessoal
Herisson com os irmãos e a mãe — Foto: Herisson Henrique / Arquivo Pessoal

Egresso de escola pública e filho de uma auxiliar de serviços gerais e de um mototaxista, Herisson teve certeza que queria ser médico ao assistir a um filme que conta a história de um neurocirurgião que se formou após superar várias adversidades. Antes disso, o funcionamento do corpo humano já despertava curiosidade e o interesse dele.

“No primeiro semestre do curso, perdi meu pai em um acidente de moto. Isso reforçou ainda mais a minha responsabilidade de médico, de cuidar de outras pessoas. Acredito cada vez mais que estamos aqui para servir aos outros."
Beneficiado pelo Programa Universidade para Todos e por meio das notas do Exame Nacional do Ensino Médio, conseguiu uma bolsa integral em uma faculdade particular. Ao mesmo tempo em que estudava, trabalhava como auxiliar administrativo.


"O trabalho dos profissionais de saúde é importante no aspecto técnico, mas é extremamente importante também no humano. Estou à frente de uma guerra e tenho que fazer a diferença de alguma forma.”

Por Michelly Oda, G1 Grande Minas

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